quinta-feira, 19 de dezembro de 2013

SEM FREIOS
Quando eu tinha 11 anos, minha família e eu embarcamos em uma de nossas viagens. Desta vez para visitar minha avó, em Minas Gerais.
O carro havia saído do conserto há pouco tempo. Era um fiat 147 azul escuro pelo qual tínhamos um apreço grande: era o primeiro carro da família.
Sempre achei esse trajeto muito bonito, com uma paisagem arborizada e diferente. Principalmente quando passávamos por uma serra a certa altura da Fernão Dias.
A viagem transcorreu como de costume até chegarmos ao trecho da referida serra. Nesse ponto atingimos uma descida com curvas bem fechadas.
No início da descida, há uma placa indicando curva perigosa. Meu pai sempre foi cuidadoso ao dirigir e sempre podíamos sentir como o carro diminuía a velocidade ao chegar neste trecho. Estranhamente, dessa vez, não percebemos nada.
Minha mãe olhou para ele e perguntou: “esqueceu a curva?”, ao que meu pai, pálido, respondeu: “não tem freios. Estou pisando, mas não tem freios”.
Não sou capaz de descrever exatamente um momento como esse. Uma mistura de descrença, desespero, medo... É muito complexo.
Meu pai teve de fazer uma escolha difícil: tentar encarar a curva e a serra com a velocidade do carro aumentando ou jogar o carro na mureta de ferro da estrada para tentar pará-lo. Ele escolheu a mureta.
Foi rápido. Um cantar de pneus, um impacto seco e estávamos parados. Primeiro, ficamos parados por alguns minutos, todos em choque. Depois, saímos todos do carro para avaliar a situação. Ninguém se machucou. A roda dianteira do carro se foi.
Carros foram encostando na pista para saber se estávamos bem. Enfim chegou a polícia rodoviária. Foi um processo lento até a chegada de um guincho, boletim de ocorrência, avaliação física.
No final, fico com a frase do policial que viu o carro, ouviu a história e olhou para nós, inteiros: “Não voltem para casa. Terminem a viagem e visitem sua avó. Vocês merecem isso, vocês nasceram de novo”. E assim foi.
Fabiana

Campinas, 11/12/2013.

quinta-feira, 12 de dezembro de 2013

A TOCAIA
Essa história se passou há muito tempo atrás.
Havia um fazendeiro que possuía terras extensas e era conhecido como Coronel Nunes. Ele era casado com a jovem Rosena, moça de boa família da região. Juntos, ele tiveram 10 filhos.
Um dia, um fazendeiro de outras paragens, acabou comprando as terras vizinhas ao do Coronel Nunes e, a partir, a guerra começou.
Aparentemente, havia uma discrepância na escritura das terras, fazendo com que fosse dúbia a região da divisória. Com isso, eles estavam sempre brigando sobre onde deveria passar a cerca que separava as posses de cada um. Claro, cada um empurrando a cerca de forma a aumentar suas terras.
Essa luta se estendeu por muito tempo, sem nunca um vislumbre de acordo. Então, o outro fazendeiro resolver tomar uma medida mais drástica: tramou o assassinato do Coronel Nunes.
Mas o Coronel tinha aliados, e acabou informado da conspiração e partiu para as terras de um conhecido, para planejar o que fazer a seguir.
Inconformado, o inimigo tramou um plano ainda funesto. Para atrair o coronel de volta, atacou sua família.
Pagou uma velha escrava forra para dar fim a Rosena, que a visitava com frequência. Atraída pelo dinheiro, a velha envenenou os biscoitos que ofereceu a jovem, que morreu algumas horas depois. A velha acabou não suportando o remorso pelo que fez e suicidou-se no dia seguinte.
Com isso, as crianças ficaram sozinhas e o Coronel Nunes teve de voltar. Vinha a cavalo sem saber o que o aguardava. Uma tocaia numa curva da estrada e, com um tiro, chegava ao fim sua jornada.
Houve uma grande comoção na região e as pessoas se revoltaram contra o fazendeiro inimigo, que teve de fugir com sua família, abandonando suas terras, para não acabar preso ou morto.
Minha avó não sabia mais detalhes da história. Ela e seus irmãos foram espalhados entre parentes, madrinhas e conhecidos e foram criados distantes. Ela nunca soube a origem de seus pais, de onde eles haviam vindo.
Hoje, ao passar pela região, é possível ver uma grande extensão de terra abandonada, coberta de capim alto. E, olhando com cuidado, vê-se o que restou de uma cerca velha, toda corroída, esquecida no tempo.
Fabiana

Campinas, 11/12/2013.

quarta-feira, 11 de dezembro de 2013

OS MARIMBOMDOS
Estávamos na casa de um tio meu, que mora em Minas Gerais. Era muito cedo, mas as crianças não se importam de levantar bem cedo.
Eu tinha por volta de 9 anos e saí para o quintal tomando uma caneca de leite puro, tirado da vaca a menos de uma hora. Devo dizer que é um leite bem interessante de ser consumido e qualquer dia vou contar sobre como aprendi a tirar leite.
Caminhei pelo quintal, apreciando a vista, apesar de grande parte dela ser um cafezal que se estendia até onde a vista alcançava.
Meus primos, de idade próxima a minha, também se levantaram e foram para o quintal. Em grande parte já fazendo uma algazarra imensa.
Eu continuei caminhando com minha caneca até parar debaixo de uma janela. Nem atentei para o fato de que no teto, acima desta janela, havia um cacho de marimbondos, que neste momento levavam suas vidas tranquilamente.
Observei minha prima passar por mim, observando algo muito alto, mas novamente não me interessei em procurar o que era. Foi um grande engano.
Quando estava a uma certa distância, minha prima pegou um punhado de areia e jogou em algo acima de mim. Só neste momento desviei minha atenção para o que seria, mas já era tarde. Senti uma dor forte no braço e corri, com os marimbondos em meu encalço.
Foi uma corrida desesperada. Levei outras três picadas. E então me refugiei dentro de casa. Mais calma, pude ouvir os gritos de minha prima, de quem eu havia esquecido completamente com a dor e que ainda estava lá fora. Gritei para que ela entrasse e fechamos a porta.
Vi meu braço inchado e vermelho, mas tomei um susto ao olhar para ela: seu rosto estava muito inchado, já que todas as suas picadas foram no rosto.
No lugar em que estávamos não há atendimento médico, não há nada. Nosso socorro foi minha tia procurando ferrões e meu tio passando pinga para “desinfetar”o local das picadas.
Senti ódio de minha prima, mas depois de algum tempo olhando para ela acabei perdoando. Afinal, ela ainda ficou com a pior parte.
No fim das contas, a lição é: não mexa com marimbondos. Simples assim.
Fabiana

Campinas, 11/12/2013.

quarta-feira, 4 de dezembro de 2013

 EU
Estou presa dentro de mim
E não posso sair
Eu luto, grito e me debato
Mas estou trancada e ainda não sei qual é a
Chave.
Eu quero me expor por inteiro,
Mas não consigo me virar do avesso.

Quero explicar, mas não posso
Estou me afogando nos meus sentimentos
Estou sufocada por meus pensamentos
Eu quero me expor por inteiro,
Mas não consigo me virar do avesso.

Eu quero dar amor, mas não consigo recebê-lo,
Meu coração bate descompassado
A Lua me inspira emoções
Que estacionam em minha alma.
Eu quero me expor por inteiro,
Mas não consigo me virar do avesso.

Canto, choro, sinto tudo ao mesmo tempo,
Mas não demonstro.
Meu corpo e minha mente estão desconexos
Nada é como parece
Eu quero me expor por inteiro,
Mas não consigo me virar do avesso.

Quero abrir meu espírito,
Mas não posso abrir os olhos
Então vejo imagens distorcidas
E vejo tudo ao meu redor,
Mas não vejo a mim mesma.
Eu quero me expor por inteiro,
Mas não consigo me virar do avesso.

Me olhando no espelho partido vejo mil almas,
Mas nenhuma sou eu
Todas estão em mim
E nenhuma é a essência.
Eu quero me expor por inteiro,
Mas não consigo me virar do avesso.

Eu não tenho paciência comigo,
Mas não posso viver sem mim
Quero apenas abrir o casulo
Eu quero me expor por inteiro,
Mas não consigo me virar do avesso.

O tempo demora a passar dentro de mim
Um milênio a cada segundo.
Quero fugir pra outro tempo
Eu quero me expor por inteiro,
Mas não consigo me virar do avesso.

Não quero desejar,
Mas já é tarde
Isso aumenta a dor da prisão
Faz o pássaro querer voar.
Eu quero me expor por inteiro,
E ainda vou conseguir me virar do avesso!

São Paulo, janeiro/2004

segunda-feira, 2 de dezembro de 2013

SOBRE ACADEMIAS
Já contei recentemente que estou praticando atividade física regular. Infelizmente, estou usando um método do qual nunca gostei: a academia.
Ao longo da vida, fiz várias tentativas de frenquentar esse ambiente, mas nunca dava muito certo.
A primeira coisa que me stressa são os narcisistas. Aquelas pessoas que ficam se admirando no espelho da parede enquanto fazem os exercícios, fazendo caras e bocas. Sério, isso é muito desnecessário.
Outra coisa que me desgosta são os “sarados”que olham para os pobres mortais como se fossem a pior coisa da face da Terra, só porque não tem barriga de tanquinho ou porque pesam uns quilinhos a mais.
Sem falar nas piriguetes, nova classe que tem crescido exponencialmente. Outro dia, havia uma na academia de saia! Fazer academia de saia... Quando eu achei que nada mais podia me surpreender.
Há os magrelos que querem se passar por marombados. Andam pela academia “se achando”, estufando o peito e fingindo que levantam mil quilos, quando na verdade levantam menos que eu.
Também encontramos os gordinhos invejosos, que ao invés de se preocupar seus abdominais, ficam observando e falando mal das pessoas em boa forma.
E não podemos esquecer da categoria proporcionada pelas novas tecnologias: os que ficam o tempo todo mais preocupados em tirar fotos para redes sociais do que com os exercícios em si.
O pior são os professores bombados, que só sabem te olhar com desprezo.
Enfim, como já deu para perceber, eu realmente não gosto de academias. Mas dessa vez até que dei sorte.
A academia que estou frequentando tem tudo isso que já falei. Mas também tem muita gente apenas preocupada com sua série de exercícios e não com o espelho ou com os outros.
No começo, eu chegava lá e já fazia cara de poucos amigos e saia o mais rápido possível. Agora já até arrisco uma conversinha com o professor.
De qualquer forma, acho que aprendi a contornar o que mais me irrita para fazer o necessário para uma vida mais saudável e para dar uma aliviada no stress.
Mas meu lema ainda é: me mostre alguém que goste de academias e eu nunca vou entender essa pessoa.
Fabiana

São Paulo, 24/11/2013.
Desculpem a demora, mas foi um final de semana de trabalho. Agora voltando ao blog. Abraços.